O Caminho Português Central foi a nossa primeira experiência numa caminhada de vários dias. Nunca tínhamos feito uma caminhada que durasse mais do que um dia. A proximidade a Lisboa, a duração acessível de 10 dias e a logística simples facilitaram a escolha. Ao início, os 250 km pareciam intimidantes, mas à medida que começámos a planear e a treinar, tornou-se algo que nos parecia alcançável.
Um dos nossos sonhos é fazer o Laugavegur Trail, na Islândia, mas é mais remoto, caro e complicado de organizar. Para esta primeira experiência, queríamos algo mais fácil e perto de casa, para termos uma ideia de como nos sentiríamos a andar vários dias seguidos com mochila às costas.
Também considerámos o Caminho Francês, mas com uma duração média de cerca de 30 dias, não era uma opção realista para nós, especialmente com crianças pequenas em casa. O Caminho Central Português oferecia o equilíbrio ideal: um desafio físico, dentro do tempo que tínhamos disponível, e muito mais simples de organizar.
Outra razão importante para a escolha foi a diversidade de locais para comer e dormir ao longo do percurso. Sabíamos que nunca estaríamos longe de uma aldeia ou cidade caso algo corresse mal, o que é reconfortante numa viagem deste tipo, onde nem sempre tudo corre como planeado.
Quando comprámos os primeiros bilhetes de comboio e marcámos os alojamentos, a previsão meteorológica estava perfeita. Mas, à medida que o dia da partida se aproximava, tudo mudou. De repente, a previsão apontava chuva para todos os dias.
A nossa primeira etapa do Caminho de Santiago Português levou-nos desde a Sé do Porto até um turismo rural em Gião, a caminho de Vairão. Há quem opte por saltar esta parte, mas quisemos começar no Porto para comprar a caderneta do peregrino e viver o percurso completo desde o início.
Itinerário do Nosso Caminho
Dia 1: Sê do Porto até Gião

O nosso Caminho Português começou no dia 18 de abril com um pouco de caos. Saímos de casa tarde e, quando olhámos para o relógio, percebemos que não íamos chegar à Gare do Oriente a tempo. Íamos perder o comboio de Lisboa para o Porto, a não ser que fossemos a correr com as mochilas a saltar às costas, na esperança de não começarmos a peregrinação a perder o comboio.
Felizmente, conseguimos chegar mesmo a tempo e relaxámos. Tínhamos pela frente três horas de viagem rumo ao norte. Já no Porto, apanhámos outro comboio, mais curto, até à estação de São Bento, convenientemente perto do nosso ponto de partida: a Sé do Porto. Foi lá que apanhámos duas credenciais de peregrino e tirámos algumas fotografias junto à nossa primeira seta amarela, o símbolo que nos guiaria até Santiago de Compostela.

Começámos o nosso caminho debaixo de uma chuva ligeira. Nada de dramático, apenas o suficiente para nos lembrar que estávamos no norte de Portugal. As ruas estreitas e sinuosas do centro histórico do Porto tornaram o início do percurso encantador e memorável. Mas não demorou muito até deixarmos essa paisagem digna de postal para trás e entrarmos nos arredores da cidade, onde as vistas eram mais práticas do que bonitas. Prédios de betão, passeios longos e trânsito constante acompanharam-nos durante grande parte do dia.

Tentámos não acelerar, mantendo um ritmo constante para evitar bolhas. Como era a nossa primeira caminhada de longa distância, estávamos nervosos sobre como os nossos pés e pernas iriam aguentar. O nosso principal objetivo era simplesmente terminar o dia em boas condições.
Procurar a próxima seta amarela ajudava a manter a atenção e tornava o caminho mais leve e divertido. Estar sempre atento aos sinais criava um certo ritmo e dava uma sensação boa de progresso.
À medida que nos afastávamos do Porto, os passeios tornavam-se cada vez mais estreitos, por vezes desaparecendo completamente, obrigando-nos a partilhar a estrada com os carros, o que não era o ideal.
Recebemos o nosso primeiro carimbo em Gião e, surpreendentemente, foi um momento emotivo. Ter a nossa credencial do peregrino com o primeiro carimbo dava a sensação de termos passado um limite invisível. A partir desse momento, éramos oficialmente peregrinos.

Chegámos à Casa Mindela, o encantador turismo rural onde iríamos passar a noite, mesmo quando o tempo começou a piorar. Felizmente, entrámos momentos antes da chuva cair com força. O sossego e o conforto deste alojamento rural eram exatamente o que precisávamos depois do nosso primeiro dia longo no Caminho Português Central.
No final do dia, segundo o Strava, tínhamos percorrido 24,3 quilómetros com cerca de seis horas de caminhada efetiva. Foi um início desafiante, mas inesquecível, da nossa caminhada de longa distância até Santiago.
Dia 2: Gião a Barcelos

O nosso segundo dia começou com muito otimismo e um bom pequeno-almoço para nos dar energia. Tínhamos um grande dia pela frente, com cerca de 30 km planeados, mas não fazíamos ideia de quão longo e molhado acabaria por ser.
Começámos por recuar um pouco para fazer um desvio por Vairão. Acrescentou cerca de 3 km, mas permitiu-nos evitar uma secção movimentada da estrada nacional, o que nos pareceu uma troca justa. Depois de Vairão, saímos finalmente do alcatrão e entrámos na natureza pela primeira vez no Caminho Português Central. Um trilho florestal tranquilo deu-nos algum alívio do pavimento e do trânsito. Sentimos que estávamos a começar a deixar a civilização para trás e a entrar verdadeiramente no ritmo do caminho.

Pelo caminho, passámos por várias pequenas pontes romanas que deram um charme extra ao dia. Estes locais históricos inesperados tornaram a caminhada mais interessante e ajudaram a distrair-nos do desconforto crescente causado pela chuva.

Mais tarde nesse dia, tivemos de tomar uma decisão: continuar pela estrada nacional ou seguir um caminho alternativo por aldeias antigas e estradas de acesso agrícola. Optámos pela rota mais tranquila, apesar de acrescentar mais 2 km. Foi a escolha certa pela experiência, mas acabou por cansar bem mais as pernas do que esperávamos.
Depois veio a chuva. Primeiro um chuvisco, depois uma chuvada constante e, por fim, granizo. Tivemos sorte em encontrar a Quinta D. Curado mesmo a tempo — um ótimo restaurante mesmo no Caminho que oferecia menu do dia a um preço justo. Sentimo-nos como se tivéssemos escapado por pouco.
Após o almoço, a chuva não deu tréguas. Continuámos a caminhar e, a certa altura em São Pedro de Rates, reparei que os meus dedos dos pés estavam quentes. Parei para verificar e encontrei as minhas primeiras bolhas. Não foi nada de bom, mas era gerível. Apliquei lã de caminhante e fez uma grande diferença.

Mais tarde, passámos por uma escultura gigante do Galo de Barcelos e, por um momento, pensámos que estávamos quase a chegar. Mas logo apareceu a placa: “Barcelos — 14 km”. Custou bastante.
A partir daí, tudo se transformou numa verdadeira lamaçal. Os trilhos estavam encharcados, poças por todo o lado, e os nossos sapatos ensopados faziam barulhos de “chic” a cada passo. Estávamos exaustos, molhados e só queríamos que o dia acabasse.

Antes de chegarmos a Barcelos, cruzámos um marco especial: faltavam menos de 200 km para Santiago de Compostela. Foi um momento pequeno mas poderoso, que nos levantou o ânimo e nos lembrou o quanto já tínhamos caminhado e quão perto estávamos do nosso objetivo.


Acabámos por chegar a Barcelos completamente exaustos. Ficámos no Flag Hotel e, mesmo assim, ainda tivemos de lavar a roupa, tentar secar os sapatos e descansar o suficiente para conseguir continuar. Para o jantar, fomos diretos ao McDonald’s mais próximo, ansiosos por algo quente e reconfortante. Depois seguimos para a cama, na esperança de que a roupa estivesse seca de manhã.
Foi um dos dias mais duros e chuvosos que já tivemos numa viagem, mas também é daqueles dias que nunca se esquecem.
Segundo o Strava, acabámos por caminhar 36 km em pouco mais de 8h30 de tempo efetivo de marcha.
Nota: Esta etapa pode ser dividida. Embora não seja difícil nem técnica, a lama e as poças de água obrigaram-nos a abrandar constantemente e impediram-nos de manter o ritmo desejado, o que tornou o dia bastante mais exigente. Com bom tempo, esta etapa faz-se muito mais facilmente.
Dia 3: Barcelos a Ponte de Lima
Começámos o nosso terceiro dia já a sentir-nos cansados. Depois de uma noite tardia, em que só conseguimos adormecer por volta da meia-noite, acordámos cansados e doridos. O plano inicial era percorrer os 35 km até Ponte de Lima, mas com mais chuva prevista e o cansaço a acumular-se, decidimos abrandar o ritmo. Forçar demasiado poderia pôr em risco o resto do Caminho.

Decidimos encurtar o dia e apanhar o comboio durante parte do percurso. Apesar da estação se chamar Tamel, na realidade fica em Aborim, a apenas 200 metros do ponto onde se retoma o Caminho Português Central. Esta conveniência tornou a nossa decisão ainda mais fácil.
O dia foi maioritariamente chuvoso, embora a chuva fosse leve e constante. Caminhámos por terrenos agrícolas, estradas rurais tranquilas e algumas paisagens campestres pitorescas. Foi bom voltar a andar, mas a um ritmo mais calmo e descontraído.

Pelo caminho, passámos por alguns cafés e paragens de estrada. Alguns ofereciam comida e bebida, e outros tinham carimbos para as nossas credenciais de peregrino. Uns pediam uma pequena taxa, enquanto outros tinham apenas uma caixa de donativos. Estes pequenos encontros animavam sempre o nosso espírito e lembravam-nos da bondade que define o Caminho.



Chegámos a Ponte de Lima por volta das 17h, ainda com tempo para tirar algumas fotografias da bonita ponte antiga e da zona ribeirinha antes de fazermos o check-in na Pousada da Juventude. Depois de um duche quente e algum descanso para os pés, comecei a sentir algum desconforto no estômago. Não era dor nos pés desta vez, mas sim problemas de digestão que me deixaram preocupado com a forma como iria enfrentar a subida técnica do dia seguinte.
No fim, em vez de percorrermos os 35 km que tínhamos planeado, acabámos por fazer cerca de 23 km e estivemos 5h40 em movimento. Foi a decisão certa.
Dia 4: Ponte de Lima a Rubiães
O nosso quarto dia no Caminho Português Central girava em torno da Labruja. A etapa de Ponte de Lima até Rubiães é muitas vezes descrita como a mais técnica e exigente da rota portuguesa, e certamente fez jus à sua reputação.
Acordei ainda cansado, mas a sentir-me melhor do que na noite anterior. O pequeno-almoço foi simples — apenas um iogurte e um chá — mas suficiente para começar o dia. A previsão também prometia céu mais limpo, dando-nos finalmente uma pausa tão necessária na meteorologia.

Depois de atravessar o rio Lima, encontrámos rapidamente os resultados dos dias anteriores de chuva: o Caminho estava parcialmente alagado. Felizmente, tínhamos levado alguns sacos de lixo por precaução — e revelaram-se muito úteis. Vestimos por cima dos sapatos e conseguimos passar pela parte mais difícil de água e lama sem grandes problemas. Um troço estava especialmente enlameado, mas logo a seguir um pequeno riacho deu-nos a oportunidade perfeita para lavar tudo. “O Caminho providencia”, pensei. Infelizmente, um dos sacos rasgou-se e acabei com uma das meias completamente encharcada.

Ultrapassada a lama, o trilho tornou-se mais plano e ofereceu-nos belas vistas. Mas sabíamos que, assim que atravessássemos a autoestrada, a subida iria começar. Tinha dúvidas sobre como o meu corpo iria reagir, mas para minha surpresa consegui aguentar bem.


A subida à serra da Labruja foi dura, mas suportável. Pelo caminho, chegámos à Cruz dos Franceses, onde a tradição manda deixar uma pedra trazida de casa. Colocar a nossa pareceu simbólico — como se estivéssemos a deixar um fardo para trás e a seguir em frente com o espírito mais leve.

A partir deste ponto, começámos a notar uma mudança clara: cada vez mais peregrinos surgiam ao longo do trilho. Parecia que estávamos realmente a entrar no coração da comunidade do Caminho.
Embora esperássemos que este fosse o dia mais difícil por causa da subida à Labruja, ainda concordámos que o segundo dia com a chuva incessante, os desvios e os 35 km tinha sido o mais exigente até agora. Segundo o Strava, fizemos 19 km com 550 metros de desnível. Havia a opção de ir até Valença, mas teria sido demasiado. Dividir a etapa foi a decisão certa.
Pouco antes de chegar ao nosso alojamento, deparámo-nos com um pequeno trailer de comida que servia uns snacks a horas perfeitas, um impulso ideal depois da descida exigente.
Chegámos à Pensão Repouso Peregrino com a sensação de missão cumprida. A pensão era bastante isolada, sem restaurantes ou lojas por perto, mas oferecia um serviço de transporte gratuito até um restaurante próximo com um menu adequado para peregrinos. O jantar foi quente, nutritivo e exatamente o que precisávamos para recarregar energias. Também conhecemos alguns peregrinos que lá estavam, e foi ótimo partilhar esse sentimento crescente de comunidade no Caminho.

Dia 5: Rubiães a Valença
O nosso quinto dia no Caminho Português Central marcou também a última etapa em Portugal. Estávamos a caminho de Valença e, em vez de fazermos um dia completo de descanso, optámos por uma etapa mais curta e descontraída, cerca de 18 km. Foi o compromisso perfeito para dar algum descanso às pernas e, ao mesmo tempo, continuar a avançar.
Começámos o dia com um ótimo pequeno-almoço incluído na pensão e, finalmente, o tempo estava do nosso lado: sol, calor e nada de chuva. O guarda-chuva, depois de dias de muito trabalho, teve direito a um merecido descanso.

Grande parte do dia foi passada a percorrer uma antiga via romana, rodeada de vegetação e de estruturas em pedra que revelavam séculos de história. Foi um daqueles dias fáceis e gratificantes, em que os quilómetros pareciam passar sem esforço.

Chegámos ao Hotel Val Flores por volta das 14:00 e tivemos a tarde inteira para relaxar. Depois de fazer o check-in e descansar um pouco, saímos para explorar a Fortaleza de Valença.

Esta impressionante fortaleza no alto da colina ainda alberga a encantadora cidade antiga. Passear pelas estreitas ruas empedradas, com vistas sobre o rio Minho e para Espanha, foi a forma perfeita de terminar o nosso tempo em Portugal.
Amanhã atravessaríamos a fronteira para Espanha, atingindo oficialmente o ponto intermédio do nosso Caminho de Santiago Português.
Dia 6: Valença a Padron de Redondela
O sexto dia representou um momento importante, estávamos finalmente a entrar em Espanha. Acordámos cedo para os 27 km que nos esperavam, determinados a ver o nascer do sol enquanto atravessávamos a ponte sobre o rio Minho. E conseguimos. A primeira luz do dia iluminou a água, e entrar em Espanha sob esse brilho foi uma forma bonita e memorável de começar o dia.


Subimos até ao topo de Tui, e a mudança foi imediata, não só de país, mas do próprio Caminho. O número de peregrinos multiplicou-se, e a partir desse momento nunca mais estivemos verdadeiramente sozinhos na trilha.

Pouco depois, chegámos à segunda bifurcação do percurso. Optámos pelo desvio à esquerda para evitar a zona industrial, e ficámos felizes com a escolha. A alternativa oferecia mais natureza, tranquilidade e um ritmo mais calmo. Acabou por nos levar a O Porriño, onde fizemos uma paragem para almoçar.


“Depois da pausa, esperávamos chegar rapidamente ao marco dos 99 km, mas o Caminho tinha outros planos devido à escolha que fizemos na bifurcação. Continuámos a andar… e andar… e ainda sem sinal. Outros peregrinos à nossa volta também comentavam como parecia longe. Quando finalmente apareceu o marco, foi um certo alívio, mas definitivamente chegou muito mais tarde do que esperávamos.

A etapa da tarde trouxe-nos mais alcatrão e uma subida difícil, seguida de uma longa descida que, mesmo com os bastões de caminhada, se revelou mais exigente do que a subida. Quando chegámos a Padron de Redondela, a distância total do dia já tinha atingido 32 km, muito mais que os 27 que tínhamos planeado.
Ficámos no Albergue O Corisco, mesmo antes do centro da vila, que se revelou um local perfeito para terminar o dia. Cansados, mas satisfeitos, estávamos agora firmemente na contagem final dos últimos 100 km do Caminho Português Central.
Dia 7: Padron de Redondela a Pontevedra
Acordámos cedo no sétimo dia do nosso Caminho Português Central, com o objetivo de chegar a Pontevedra com tempo suficiente para explorar a cidade. Mas primeiro tínhamos de percorrer os últimos 2 km até Redondela. A partir desse ponto, como faltavam menos de 100 km até Santiago, precisávamos de carimbar duas vezes por dia os nossos credenciais de peregrino.
Partimos ao nascer do sol, bem descansados e novamente recebidos por céus limpos. O número de peregrinos no Caminho continuava a aumentar, criando uma atmosfera animada, mas ainda tranquila. O dia foi repleto de paisagens, oferecendo vistas sobre a Ría de Vigo e levando-nos por uma mistura de cidades históricas e caminhos entre bosques.


O caminho tornou-se mais exigente à medida que subíamos em direção a Cacheiro, mas ao chegar ao topo fomos recompensados com um food truck a servir bebidas frescas, exatamente o que precisávamos para refrescar e fazer uma pausa. Embora ainda tivéssemos um bom trecho pela frente, sentíamo-nos fortes e de excelente humor, e a rotina do Caminho de acordar cedo, só com os pensamentos e os passos, estava a entranhar-se.
À medida que nos aproximávamos de Pontevedra, o Caminho adquiriu uma atmosfera mais festiva, quase brincalhona. Havia bancas a vender lembranças feitas à mão, pessoas a cantar ou a tocar guitarra, e muitas conversas alegres ecoando pelo percurso. Pouco antes de Pontevedra, seguimos a variante à beira do rio, onde muitos peregrinos relaxavam junto à água.

Chegámos a Pontevedra por volta da hora de almoço, depois de percorrermos cerca de 24 km segundo o Strava. Sentíamo-nos surpreendentemente bem e aproveitámos para fazer um bom almoço. Ficámos no Hotel Alda Estación Pontevedra, muito perto da estação de comboios. Tentámos reservar bilhetes de comboio de Santiago de Compostela para Vigo, mas a maioria dos horários já estava esgotada. No final, acabámos por optar pelo Flixbus; devíamos ter reservado com mais antecedência, mas já não havia nada a fazer.

O resto da tarde foi passado a passear e explorar o centro histórico de Pontevedra, pensada para peões, absorvendo a atmosfera e refletindo sobre o caminho percorrido até ali. Sentíamo-nos a encontrar o nosso ritmo, tanto física como mentalmente, e isso deu-nos uma confiança tranquila em relação aos dias que ainda estavam por vir.

Se há uma etapa em que chegar cedo compensa mesmo, é esta. Com tempo e energia de sobra, conseguimos visitar alguns dos pontos altos de Pontevedra: a icónica Igreja da Virgem Peregrina, a Basílica de Santa Maria Maior em estilo gótico, e as atmosféricas Ruínas de São Domingos.

Foi também o lugar perfeito para abrandar o ritmo, provar algumas tapas e simplesmente desfrutar da vida do Caminho numa das cidades mais encantadoras da Galiza.
Dia 8: Pontevedra a Caldas de Reis
O oitavo dia marcou o momento em que começámos a sentir a aproximação do fim do nosso Caminho Português Central. Como era hábito, acordámos cedo, desta vez com o objetivo de chegar a Caldas de Reis com tempo para explorar a cidade.
Tínhamos cerca de 23 km pela frente, o que significava umas 5 horas de caminhada. Nesta fase da jornada, isso parecia perfeitamente ao nosso alcance. Aliás, já estávamos confiantes de que conseguiríamos percorrer 30 km por dia sem grandes dificuldades. O tempo tinha mudado um pouco, menos soalheiro do que nos dias anteriores, mas de uma forma positiva: estava mais fresco, mais confortável para caminhar e, o melhor de tudo, completamente seco.

Saímos do hotel e seguimos em direção à Ponte do Burgo, onde nos tinham dito para procurar as pequenas conchas do Caminho incrustadas nas laterais de pedra da ponte, um detalhe fácil de passar despercebido, mas belo para quem presta atenção.

A caminhada desse dia foi agradável, passando por campos tranquilos e várias pequenas localidades. Pelo caminho, parámos também em algumas igrejas que ofereciam carimbos para os peregrinos, uma tradição que já fazia parte da nossa rotina diária.

Chegámos a Caldas de Reis por volta das 14:00, a tempo de almoçar o menu do peregrino no restaurante O Encanto. Não era o sítio mais barato, mas a refeição de dois pratos foi substancial e deu-nos a energia de que precisávamos. Depois do almoço, passeámos pela cidade, absorvemos a atmosfera descontraída e até molhámos os pés nas termas públicas — um dos pequenos prazeres únicos de Caldas para os peregrinos.
Terminámos o dia na Pensão Augas Quentes, um alojamento acolhedor e confortável no coração da cidade. Foi o lugar ideal para descansar antes da etapa final do nosso Caminho.
Dia 9: Caldas de Reis a Padrón
Com menos de 50 km pela frente, o fim estava oficialmente à vista. Acordámos com uma mistura de entusiasmo e incredulidade, era difícil acreditar que o nosso Caminho estava quase a terminar. Tal como nos dias anteriores, tínhamos cerca de 20 km planeados, e previa-se uma caminhada fácil. Nesta fase, os quilómetros já não pareciam intimidantes.

À medida que as rotas se juntavam, o Caminho tornou-se visivelmente mais movimentado. O fluxo de peregrinos transformou-se numa verdadeira multidão. Sentia-se o entusiasmo a crescer, cada passo parecia trazer mais energia e mais expectativa. As pessoas sorriam mais, conversavam mais e partilhavam histórias, enquanto todos avançávamos em direção a um objetivo comum.

Foi das etapas menos marcantes em termos de paisagem. Havia menos florestas e trilhos sombreados, substituídos sobretudo por caminhos de terra, pequenas localidades e troços comerciais. Mas, de certa forma, isso já não importava. O nosso foco tinha mudado. A beleza vinha agora da própria viagem, do ritmo dos nossos passos, da companhia de desconhecidos e da consciência crescente de que estávamos prestes a concluir algo importante.

Chegámos a Padrón no início da tarde e fizemos o check-in no Hotel Chef Rivera, um excelente alojamento perto do centro histórico com uma ótima relação qualidade-preço. Depois de nos instalarmos, tirámos algum tempo para descansar e passear pela cidade, aproveitando a calma antes do esforço final.
Amanhã é o dia em que chegamos a Santiago.
Dia 10: Padrón a Santiago de Compostela
Finalmente chegou o nosso décimo e último dia no Caminho Português Central. Depois de milhares de setas amarelas, trilhos enlameados, subidas exigentes e momentos inesquecíveis, estávamos prestes a concluir a nossa peregrinação.
Acordámos cedo, cheios de expectativa. Hoje íamos finalmente chegar a Santiago de Compostela e levantar a nossa merecida Compostela. Seria um dia longo e quente, com cerca de 27 quilómetros, mas nada podia abalar a nossa energia.

A cada marco de pedra que passávamos, a nossa excitação aumentava. Vinte quilómetros. Dez. Depois cinco. Algures pelo caminho, numa banca de lembranças, disseram-nos que, se olhássemos com atenção, já conseguíamos avistar o topo da catedral ao longe. Era pequeno e distante, mas mágico. Estávamos quase a chegar.

Como o nosso autocarro de regresso só partia às 19h10, aproveitámos para desfrutar de um bom almoço em Milladoiro. Escolhemos huevos rotos con jamón (ovos estrelados com presunto) e pareceu-nos a forma perfeita de celebrar o caminho que tínhamos percorrido.

Depois do almoço, continuámos o caminho. O último troço foi difícil. Na última bifurcação voltámos a escolher o caminho da esquerda. Santiago estava perto, mas o sol fazia com que cada passo parecesse mais longo. O centro histórico parecia estar sempre ao virar da esquina. Mas continuámos a andar.

Às 15h00, estávamos à frente da Catedral de Santiago de Compostela. Depois de cerca de 250 quilómetros, tínhamos concluído o Caminho. Estávamos cansados, mas incrivelmente felizes. Tirámos fotografias, descansámos na praça e deixámo-nos simplesmente absorver pelo momento. Até nos cruzámos com pessoas que conhecemos durante o caminho e que também estavam a celebrar o momento.

Como nos tínhamos registado online (podes e deves registar-te aqui), receber as nossas Compostelas foi rápido. Poucos minutos depois, já as tínhamos nas mãos.
O resto da tarde foi passado a explorar o centro histórico. Visitámos a catedral, tocámos na estátua de São Tiago e entrámos na cripta. Foi um final especial para uma viagem inesquecível.
Depois de tudo, despedimo-nos de Santiago e seguimos para Vigo, onde passaríamos a noite. Era tempo de descansar e começar a pensar no regresso a casa.
O que poderia correr mal agora?
Bem, na manhã seguinte houve um apagão em Portugal e Espanha.
Mas essa é uma história para outra ocasião.